Pois hoje vou lhes contar uma
historinha que em primeira mão me despertou um lado MAU, depois ponderei e
voltei a trilhar pelo caminho no qual me nego a pisar nos calos de que quer que
seja (como não sou santo, nem santarrão, desde que não pisem nos meus
calos). Porque? Pelo desenrolar dos
acontecimentos, pela presença irretocável do reconhecimento, nas reações e nas
atitudes, vejam vocês...
*
Sábado passado, já em Porto
Alegre, e voltando para casa, já na Av Bento Gonçalves, num trânsito lento
quase parando, parado, e como sempre, enquanto dirijo mantenho um sentido
aguçado de observação. Numas destas paradas, observo ao meu lado esquerdo, na
pista de maior velocidade, um desses carrões da Hyundai, e na sua direção uma
bela dama, loiríssima, diria beirando os trinta e lá vão. Meu carro está um
pouco aquém da sua janela da frente, em minha visão ela esta de perfil, então ela
aumenta o som do carro, e faz algo que via regra pertence ao mundo das
crianças, e, eventualmente, do universo masculino (tal como já foi flagrado o
técnico, e ex-jogador da futebol, da seleção alemã, em pleno jogo
internacional), ou seja, definitivamente, coçou o cérebro, nariz adentro, com
seu dedinho indicador, que poderia ser de uma pianista, longo e delgado. Na
sequência, na santa paz da sua imaginária privacidade, limpou o dedinho com
seus dentes, utilizando os lábios, aliás, carnudos, no ato final desta
concepção...
Como diria meu sobrinho Matheus,
caraca, cara...! Confesso, não resisti, como havia espaço para ir um pouco mais
a frente com o carro, foi o que fiz, e devo ter colocado um sorrisinho muito
Gardel e irônico na minha expressão, ao olhá-la descaradamente...pô, gente, é
impagável visualizar a cena. Quando ela
me percebeu e, por consequência, soube o que eu vira...rapaz, tadinha, ai me
deu pena e arrependimento, eu podia ter deixado passar...ah, somos humanos, e,
as vezes, maus.
Ela empalideceu, cravou os olhos
a frente e por sua sorte, sua fila andou, e bem mais rápida do que aquela em
que eu estava, e ela pode desaparecer das minhas vistas... Mas seu rosto ficou
gravadinho na minha mente, até porque ela é muito linda, e a beleza me é
atrativo.
Diriam...ah, deixa estar, acabou.
Nunca mais vou vê-la mesmo, mas fiquei me penalizando, poxa, tu poderias ter
poupado a dama...que maldade!
Mas a vida apronta, e não é que o
inusitado aconteceu.
Domingo a tardinha, lá estou eu no aeroporto, já diante do portão 23 da Azul, quanto me toca
sentir a sensação de estar sendo observado. Evidente, meu olhar buscou os
arredores, passando levemente pelas pessoas, ah, caramba, dentre estas ela me
olha atentamente, sim, ELA! A dama.
Deixei meu olhar seguir adiante
como se não tivesse percebido sua concentração e tomei uma decisão, poxa, seja
gentil, faça de conta de que você não a reconheceu. E foi o que fiz.
Pessoal, dali pra frente,
enquanto esperava, em muitos momentos eu tive absoluta convicção de que ela
estava testando o meu reconhecimento (e convenhamos, estava muito elegante,
chamava a atenção), pois andava pelo salão, sempre procurando se colocar no meu
ângulo de visão, e, eu, firme, silente, sem demonstrar um mínimo da ironia
cínica que queria explodir na minha face, na estampa de um sorriso largo.
Quando chamaram meu voo, ela não
estava nele, seria um pouco demais, dei uma última cruzada de olhar pelo salão,
e, então, deixei transparecer, eu a VI.
De imediato, pude sentir a sua
tensão, seu rosto isolou-se em expectativa, num tangido de uma imolação
emocional perceptível de acontecer, então, definitivamente, deixei meu olhar
seguir impessoalmente em frente, ignorando-a.
Enquanto partia e entregava meu
bilhete a funcionária da Azul, na percepção da minha visão periférica, pude
sorrir para mim mesmo, pois estava deixando para trás alguém que havia
respirado fundo, retomado suas cores e obtido a certeza de que eu não a
reconhecera.
Confesso, o ato de sorrir para
mim mesmo, se fez júbilo pois me permiti corroborar em atitude a salvaguarda de
uma pequena maldade.
Em minha mente lhe desejei: - Vá
em frente minha dama, maravilhe-nos com sua beleza e elegância...mas não coce
mais o cérebro!
Nenhum comentário:
Postar um comentário